Imagine um lugar cercado por muralhas, ruelas estreitas, cores vibrantes e casas coloniais de varandas floridas. Parece um cenário de algum conto não é mesmo? Mas assim é Cartagena das Índias, o que explica o fascínio do Nobel de Literatura, Gabriel García Márquez pelo destino. De fato uma vez dentro do centro histórico amuralhado, eleito Patrimônio da Humanidade pela Unesco, é como fazer parte dos romances e crônicas de Gabo (apelido carinhoso do escritor). Ok, que em suas obras, ele não costumava se referir diretamente à Cartagena, mas as “pistas” ficam evidentes em dois livros: Amor nos Tempos do Cólera e Do Amor e Outros Demônios. Em sua autobiografia Viver para contá-la, ele recorda sua primeira vez na cidade, em 1948.
Assim como eu, o amor do autor pela cidade foi à primeira vista, tanto é que lhe rendeu esta famosa declaração: “Bastou-me dar um passo dentro da muralha para vê-la em toda a sua grandeza à luz malva das seis da tarde e não pude reprimir o sentimento de ter voltado a nascer”. Faço das palavras dele, as minhas, pois uma vez em Cartagena será impossível não se apaixonar pelo destino. É lindo!
A entrada principal das muralhas é um ícone: a Torre do Relógio. Logo de cara você irá se deparar com o Portal de los Dulces – como o nome já indica, há uma infinidade de doces para experimentar. Muro adentro, perca-se pelas ruelas e praças.
Aliás, há 35 pontos na cidade relacionados ao escritor colombiano. Um deleite para os fãs (meu caso). O tour “A Cartagena de García Márquez – Histórias Reais e Imaginárias” foi especialmente criado para homenageá-lo. Com audioguia em espanhol, inglês, alemão, italiano e francês, efeitos sonoros especiais e narrações de trechos literários, a caminhada propõe um circuito pelos locais mágicos e misteriosos presentes nas histórias ou simplesmente relacionados à vida do autor. É um tributo emocionante e também uma ótima maneira de conhecer o centro histórico.
O percurso inclui, por exemplo, o Portal de los Escribanos (na realidade, Portal de los Dulces), onde Florentino Ariza e Fermina Daza, protagonistas de Amor nos Tempos do Cólera, se encontraram pela primeira vez. A propriedade que serviu de inspiração para o livro Do Amor e Outros Demônios também está no roteiro, é o luxuoso hotel Sofitel Santa Clara, que na obra aparece como o convento de Santa Clara, onde o padre Cayetano Delaura se apaixona pela jovem Sierva María de Todos los Ángeles ao tentar exorcizá-la.
Apesar de tornar o imaginário realidade, nem tudo é ficção, durante o passeio, de cerca de 2h30, se descobre muito da vida e história de García Márquez. O luxuoso hotel fica justamente ao lado da casa do escritor. Já na Praça Bolívar é narrada sua chegada a cidade. Outra passagem interessante é o número 3-81 da rua San Juan de Dios, antiga sede do jornal liberal El Universal, onde o autor do aclamado Cem Anos de Solidão deu seus primeiros passos no jornalismo. Fora do percurso cultural, mas um ótimo jeito de encerrar este passeio está o Bazurto Social Club, um dos locais prediletos de Gabo para apreciar algumas empanadas.
O centro histórico também pode ser descoberto em passeios de charrete, algo ainda mais encantador a luz do luar. E lembram que mencionei as praças, elas são uma constante, a cada dobrar de esquinas. A maior delas é a de Santo Domingo, uma das mais movimentadas e animadas, seja dia ou noite. Por lá você irá se deparar com Gertrudes, escultura doada pelo colombiano Fernando Botero. Outra muito badalada, especialmente após o entardecer, é Santa Tereza.
Já na praça Bolívar, se encontra o Palácio da Inquisição – casarão do século 18 que serviu de abrigo para a inquisição espanhola interrogar e torturar os hereges. Do outro lado do quadrilátero fica a catedral, datada do século 16, com um imponente altar folheado a ouro. Próximo dali fica o Museu do Ouro Zenú, com uma coleção de peças feitas por essa antiga civilização que habitou o norte da Colômbia até a chegada dos espanhóis – a partir de 1533.
Quase que como uma história infantil, ou um filme digno de certo capitão aí, as muralhas foram erguidas para evitar ataques piratas, isso porque, Cartagena foi no passado o porto mais importante das Américas e, por essa razão, um alvo constante. E é justamente neste clima que apresento outro ponto turístico que tem que constar no roteiro: o Castelo de San Felipe de Barajas. Fora do centro amuralhado, a fortaleza militar construída no século 16 sobre uma colina tem um belo panorama das partes antiga e moderna da cidade. Há um tour interno, que talvez os mais claustrofóbicos queiram evitar.
Achou que eu ia terminar sem falar de gastronomia e compras? Capaz! Com relação a culinária, ela é bem temperada, mas de um jeito bom, e como já falei no texto de Bogotá, sou fresca, então acreditem quando digo que gostei. Acho que muito por conta da mescla da culinária espanhola com toques africanos e indígenas.
Um dos restaurantes mais conhecidos do centro antigo é o El Santísimo, que adiciona inspirações francesas a receitas locais. Uma boa pedida é o obatalá, à base de punta de anca (corte equivalente à picanha), servido com arroz de coco e bananas. Já o charmoso Candé, de cozinha 100% cartagenera, é ideal para experimentar refeições tradicionais. Quem quiser apenas curtir a noite, pode optar pelo El Coro, bar do hotel Sofitel Santa Clara, ou o Café del Mar, um dos locais mais procurados para apreciar o pôr do sol.
Na hora de garantir lembrancinhas na mala a parada certa é o Quartel das Bóvedas, cujas antigas celas foram convertidas em ‘tiendas’ de artesanato. Por lá tem várias opções das típicas bolsas wayuu (tribo indígena), assim como as famosas esmeraldas colombianas. Vale tentar negociar o preço dos produtos – alguns comerciantes dão brecha para isso.
Cartagena foi o principal local de filmagem da adaptação cinematográfica de O Amor nos Tempos do Cólera, estrelado por Javier Bardem. Quem não viu, e já foi ao destino, fica a dica para matar a saudade, aos que ainda não o riscaram da bucktlist é uma boa para inspirar uma possível viagem.
‘Playas’ à caribenha
Quando se fala de Cartagena é inevitável não pensar em praia também, contudo, é preciso dizer que, as melhores da cidade estão a um curto passeio de barco, nas 27 ilhas que formam o arquipélago Islas del Rosario – todas de areia branquinha e fina.
E, claro aquele mar com tonalidade típica do Caribe, as águas claras são ótimas para relaxar, ou mesmo contemplar a diversidade marinha com um snorkel. Aos que gostam de um pouco mais de ação, dá para praticar diversas atividades aquáticas.
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Foto do destaque: Pixabay