Cervejarias artesanais e amantes da bebida comemoram, nesta sexta-feira (5), o Dia Internacional da Cerveja, que já tem 10 mil anos de história. A data, criada em 2007, nos Estados Unidos, é celebrada hoje em todo o mundo. O Brasil, segundo levantamento feito em 2021 pela associação que reúne as indústrias do setor, é o terceiro maior produtor mundial. São 1.383 empresas de acordo com o Anuário da Cerveja do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento que comercializaram um total de 14,3 bilhões de litros no ano passado.
Apesar de impulsionarem o número de cervejarias artesanais registradas no país, as pequenas indústrias responsáveis pela produção das chamadas cervejas artesanais respondiam, em 2020, por apenas 1% da produção nacional. Segundo a CervBrasil, 59% da produção estão nas mãos das dez marcas mais vendidas do país.
A avaliação do Ministério da Agricultura é que durante a pandemia, com o fechamento de bares e restaurantes, as pequenas cervejarias foram diretamente afetadas. Uma pesquisa feita pelo Sebrae junto à Receita Federal em 2018 identificou que 16% das novas cervejarias abertas no país tinham “artesanal” no registro. Esse percentual caiu em 2020 e 2021 para 12% e 9%, respectivamente, e voltou a crescer este ano com 11%. A volta da atividade econômica com a reabertura do comércio e a retomada do turismo, fruto da campanha de vacinação contra a Covid-19, anima os donos de pequenos negócios do setor.
O analista de Competitividade do Sebrae Alberto Vallim avalia que houve um período de grande crescimento do volume de pequenas cervejarias até 2018. A partir do ano seguinte, entretanto, essa velocidade diminuiu, e com a pandemia essa tendência de desaceleração foi reforçada. Nesse momento, o segmento continua crescendo, mas de forma bem mais lenta. “O que temos agora é um cenário diferente do início do boom das cervejarias artesanais. Há boas oportunidades por conta da retomada do setor de bares e restaurantes, do turismo e dos eventos e festas. Além disso, há um mercado fidelizado de consumidores que nos últimos anos conheceram as cervejas artesanais e agora priorizam o consumo de produtos de qualidade, diferenciados e feitos localmente”, avalia Vallim.
Apesar disso, o analista considera que ainda há grandes desafios, como um mercado com mais concorrentes, inclusive com grandes marcas que fizeram aquisições de cervejarias artesanais; a diminuição do poder de compra da população; e o aumentos dos custos, especialmente da energia e de insumos importados. Em síntese: “Esse cenário resume as perspectivas para os próximos anos: um mercado em expansão, mas com uma dose maior de complexidade e de risco”, conclui.
Retomada gradual
A empresária Raquel Diehl é uma das sócias da cervejaria Narcose, que fica em Capão de Canoa (RS). O empreendimento foi inaugurado em 2017 pelo pai e hoje é administrado por ela e pelo irmão Daniel, que cuida da produção. Começou com cerca de cinco funcionários, em um espaço onde funcionavam juntas as áreas de produção e venda.
Raquel lembra que a cervejaria estava em pleno crescimento no momento da chegada da pandemia. No primeiro momento, as vendas caíram e, consequentemente, o faturamento da empresa. Para tentar mudar a situação, Raquel fez um curso no Sebrae voltado para a transformação digital. “O Sebrae nos ajudou a criar um catálogo on-line que nós ainda não tínhamos. Além disso, tivemos uma consultoria de marketing digital voltado à conversão de vendas, que ajudou na ideia de estrutura que criamos em torno do site”, explica.
Com a reabertura do comércio, as vendas voltaram a crescer. Hoje, Raquel está otimista, apesar do momento econômico do país. Segundo a empresária, o mercado está reaquecendo aos poucos. Por isso, ela vai continuar com os investimentos para a criação de novos produtos, tocar o dia a dia, adiando, por enquanto, a aplicação de grandes recursos para aumentar a capacidade produtiva. “A criação de novos produtos e serviços é algo constante na empresa. Ano passado, nós aumentamos a nossa capacidade de produção. Vamos segurar este ano e no próximo, até para colhermos os frutos do que já foi investido”, acrescenta.
Da fazenda para a internet
Em 2014, a jornalista Patrícia Muller se juntou à professora da Universidade de Brasília (UnB) Grace Ghesti para desenvolver uma cerveja que seria comercializada exclusivamente na fazenda da família. A propriedade funciona como pousada e está localizada na Chapada dos Veadeiros, Goiás. A primeira cerveja, feita em pouca quantidade, já se mostrou um sucesso, dando início à Cervejaria São Bento.
De lá pra cá, Patrícia fez vários cursos. O primeiro foi de sommelier de cervejas do Science of Beer Institute, conceituada organização de ensino especialista em cerveja. Em seguida, a empresária foi ao Rio de Janeiro participar de cursos técnicos e, na volta, começou a produzir cervejas de trigo.
A pandemia causada pela Covid-19 trouxe desafios para Patrícia, que não divulgava e nem vendia as cervejas pela internet. Foi durante a Semana de Transformação Digital do Sebrae, em abril de 2020, que ela decidiu mudar e investir na presença digital da marca. Ela conseguiu vender todo o estoque que estava na fazenda desde o momento da decretação do lockdown.
A empresária avalia que o mercado está, aos poucos, voltando à normalidade. De olho no futuro, ela espera que o movimento retome o patamar de antes da pandemia e que haja uma retomada na procura por cervejas mais complexas, com sabores e aromas para um paladar mais educado, com mais conhecimento. “É o caso de cervejas que não tinham estilos tão conhecidos, mas que tinham o propósito de trazer o público para um mercado rico de aroma e sabor, como é o mercado de cerveja artesanal. Tenho começado a pensar em um lançar produto com mais complexidade, tentar arriscar. Não é o meu próximo lançamento. Ainda estou esperando como o mercado vai estar”, explica.
Empresa valoriza os sabores locais
Em 2009, Normando Campos Siqueira resolveu fazer um curso de produção de cerveja e chamou o pai para acompanhá-lo. Dois anos depois, eles viajaram para a Europa para conhecer as cervejarias de diversos países e voltaram para o Brasil com a ideia de abrir uma empresa com o conceito de “cervejaria de fazenda”. Em 2014, nasceu a Uaimií. A expressão significa Nascente do Rio das Velhas, em tupi-guarani, e é uma homenagem às águas que banham os arredores da Estrada Real, onde fica a fazenda da família. A cervejaria começou com a fabricação de cinco rótulos.
“Cada uma com o nome de personagens da história da região”, conta Normando. A escolha do empresário para ganhar mercado foi trabalhar o fortalecimento da marca. “Nós apostamos no nosso terroir (a fazenda e o ecossistema local) para vender uma experiência dentro da cervejaria. Além disso, temos energia solar, reaproveitamento da água e realizamos a transformação do bagaço em insumos e adubo para a própria fazenda”, relata. De lá para cá, o número de rótulos fabricados aumentou. A cervejaria lançou duas cervejas com nomes de flores e mais três com nomes de animais que vivem na região da Bacia das Velhas. Atualmente, a produção é de 15 mil litros por mês, que são destinados predominantemente ao mercado mineiro.
Segundo Normando, a situação das cervejarias em geral é muito emblemática por causa da forte tributação. “São muitos tributos que não deixam a gente crescer. As novas cervejarias pressionam e somos esmagados pelas grandes”, avalia. O empresário conta que as cervejarias de Minas Gerais se uniram e criaram, com a ajuda do Sebrae, uma associação: a Amacerva. Essa união, comenta, ajudou a melhorar as condições do mercado.
Veja também sobre o Museu da Cerveja que é atração em Campos do Jordão (SP).