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Doutor Estranho: um vilão dentro do próprio herói

A mais recente produção da Marvel, “Doutor Estranho”, vem fazendo muito sucesso, tanto de público como de crítica. O filme, baseado no personagem dos quadrinhos originalmente criado pelo lendário Stan Lee em parceria com Steve Ditko, conta a história do doutor Stephen Strange (Benedict Cumberbatch), um neurocirurgião incrivelmente talentoso que perde o controle motor de suas mãos após um trágico acidente de carro. Em busca de uma cura, ele acaba descobrindo Kamar-Taj, um centro místico repleto de mestres que usam magia para lutar contra forças malignas que podem destruir nossa realidade. Strange acaba abrindo sua mente para um universo repleto de conhecimentos milenares, adquirindo poderes mágicos e lutando contra forças de destruição.

Assim como o próprio filme diz, trata-se de versão mágica da franquia “Os Vingadores”. Porém, “Doutor Estranho” traz inovações interessantes. A primeira delas é o uso generalizado da estética de fractais. Fractais são figuras geométricas que podem ser divididas em partes menores que são muito parecidas com a figura original. Eles podem ser divididos infinitamente. Muitas produções, como “O Grande Lebowski” dos irmãos Cohen, utilizam fractais na estética do sonho.

Fractais podem ser encontrados na natureza, como nos cristais de neve, mas também fazem parte dos sonhos, já que é preciso um mecanismo orgânico que reestrutura traumas e momentos estressantes. Aquele tipo de sonho que se repete constantemente, muitas vezes sendo um sonho dentro de um sonho, faz parte desta busca por um mundo estruturado em que se pode viver tranquilamente. Porém, em “Doutor Estranho” é a primeira vez em que fractais são usados como arma de forma generalizada. Por exemplo, o personagem da Anciã (Tilda Swinton) usa fractais logo na primeira cena para confundir o inimigo. Esses fractais são usados com a alteração de perspectiva, inspirado não somente pelas produções de Christopher Nolan, como “A Origem”, mas principalmente por pinturas de M.C. Escher.

Porém, o que faz o uso de fractais ser bem-sucedido em “Doutor Estranho” – não só esteticamente, mas também no enredo do filme – é a ligação com um protagonista portador de deficiência física. Já foram explorados no cinema heróis que se parecem com deuses gregos (Batman ou Superman), heróis adolescentes (Homem-Aranha), heróis desconfigurados e feios (Deadpool ou certos personagens do X-men), ou ainda heróis cadeirantes (como no caso do Professor Xavier, líder dos X-Men). Por outro lado, esta é a primeira vez em que se explora – mesmo que indiretamente – os traumas da mente de um portador de deficiência, que teve a realidade destruída e reconstruída por meio desta estética de fractais. Uma manifestação visual que serve de metáfora para o novo rumo que uma pessoa portadora de deficiência precisa encontrar para dar nova razão à vida.

Usando fractais e mudanças de perspectiva como arma, a história mostra ao herói e ao público a poderosa força que é preciso ter para dar sentido às mudanças não planejadas. Embora muitos críticos acreditem que o vilão místico do filme deixa a desejar, o vilão dentro do próprio herói, aquele que precisa lutar contra uma visão de mundo destruída pelo acidente de carro, dá vida ao Doutor Estranho.

* Daniel Bydlowski é cineasta brasileiro com Master in fine Arts pela University of Southern of California e doutorando na University of California, em Santa Barbara, nos EUA. É membro do Directors Guild of America e trabalhou ao lado de grandes nomes da indústria cinematográfica como Mark Jonathan Harris e Marsha Kinder em projetos com temas sociais importantes. Atualmente, está produzindo Nano Éden, primeiro longa em realidade virtual 3D.

Fotos: Marvel/divulgação

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